Justificativa do Projeto

A justificativa para a realização do projeto de pesquisa está ancorada em três grandes motivações, quais sejam: a inovação da proposta; a expressividade das diferentes modalidades de participação no Brasil contemporâneo; e a composição das equipes dos programas de pós-graduação que ora apresentam a proposta. Vejamos com mais detalhes. Em primeiro lugar, entendemos como inédita a pretensão deste projeto de pesquisa em agregar quatro campos de estudo sobre a temática da participação política. De maneira geral, as pesquisas realizadas no Brasil se apresentam setorizadas em diferentes áreas de estudos -seja na área de cultura política e de comportamento eleitoral; seja sobre o associativismo, a sociedade civil ou capital social; seja sobre democracia participativa ou participação institucionalizada ou; por fim, sobre os ativismos integrados sob a perspectiva teórica dos movimentos sociais. Tal situação, compreensível pela necessidade sempre premente de recortes nos objetos de pesquisa, leva a um entendimento sempre parcial das questões relacionadas ao comportamento político no contexto democrático. No entanto, o que se tem colocado cada vez com mais força na literatura internacional sobre comportamento político são as hipóteses a respeito da emergência de um novo padrão de cidadania crítica em escala global (NORRIS, 2002; 2007, INGLEHART e WELZEL, 2009), onde são tematizados os diferentes papéis desempenhados pelas associações e movimentos sociais nas democracias contemporâneas ou, sob outro aspecto, as relações entre as formas tradicionais de representação nas democracias e a necessidade de seu aprofundamento por meio de experiências de participação direta que tendem a se institucionalizar (PERUZZOTTI e SELEE, 2009; PERUZZOTTI, 2008). Ademais, vale registrar que no âmbito da teoria democrática vem também ganhando importância o debate sobre as relações constitutivas entre participação e representação política. Diante da complexidade e pluralidade das sociedades contemporâneas e das formas muitas vezes supra-territoriais que suas expressões políticas adquirem, a participação de indivíduos em organizações da sociedade civil e a destas em arranjos institucionalizados são vistos, assim, não como modalidades de ação política alternativas ou paralelas à representação política, mas como elementos constitutivos da própria engrenagem dos governos representativos (CASTIGLIONE e WARREN, 2006; URBINATI, 2006.) O projeto pretende promover, a partir do tratamento em conjunto dos quatro campos de participação política – possibilitado pela articulação das equipes de pesquisa de cada instituição (ver descrição abaixo) – a identificação e a compreensão das particularidades da suposta emergência de uma cidadania crítica em cenários complexos como o brasileiro, em que se denota um histórico de déficit democrático, mas, ao mesmo tempo, um renovado ativismo societário (sobretudo a partir dos anos 1980) e, a partir da década de 1990, a geração de inovações institucionais enraizadas nas políticas públicas, que ampliam as formas de acesso ao sistema político. Desse modo, pretende-se desenvolver metodologias de análise que possam considerar as relações e interfaces entre as quatro formas de participação política, em que se identifiquem períodos de maior ou menor profusão de ativismos, padrões de dominância de uma ou outra forma de participação política, grupos e movimentos sociais mais ou menos identificados a cada uma delas entre 1988 e 2013. Entendemos que a conjunção dessas quatro formas em um mesmo projeto de pesquisa é uma forte justificativa para a sua realização. A segunda motivação se insere no contexto, mais imediato, conjuntural, das questões relacionadas à participação política no cenário brasileiro e, especialmente, às manifestações de rua ocorridas de maneira intensa e abrangente no mês de junho de 2013. Longe de apresentar explicações fáceis e apriorísticas, entendemos que as manifestações de junho devem ser compreendidas a partir de um referencial teórico e analítico mais amplo, que o insira como uma modalidade de participação política que pode ter o potencial de colocar em xeque as modalidades institucionalizadas, como o voto em eleições gerais ou mesmo a participação institucional em conselhos de políticas públicas. Portanto, à medida que trataremos no projeto de quatro modalidades de participação política e de suas interações, as manifestações de junho – como fenômeno relacionado à forma “protesto” ou “não convencional” – serão interpretadas na sua relação com as outras formas de participação política. E, ao mesmo tempo, sendo um projeto de pesquisa caracterizado pela análise longitudinal, parte de nossas ações estarão amparadas metodologicamente para compreender especificamente a trajetória dos ciclos de protestos no Brasil no período entre 1988 e 2013. A terceira motivação se refere a como se pretende sustentar os desafios colocados pelo projeto de pesquisa, ou seja, diz respeito às equipes de pesquisadores que compõem o projeto. Tem-se como ponto de partida várias parcerias previamente estabelecidas entre seus proponentes em torno de projetos de investigação específicos sobre Comportamento Político e Eleitoral e Associativismo e Instituições Participativas. Seu desenvolvimento promoverá o diálogo entre aquelas iniciativas e proporcionará a incorporação de outros especialistas na concretização de uma agenda de trabalho dotada da consistência e da envergadura próprias de uma produção efetivamente coletiva. Com esse perfil, a proposta ora apresentada agrega as condições necessárias para fortalecer redes de investigação e contribuir com a consolidação dos Programas de Pós-graduação envolvidos na sua execução. Com efeito, a constituição de uma rede nacional de cooperação científica em torno do tema da participação política é uma possibilidade de articular institucionalmente pesquisadores que, ao longo dos últimos anos, têm realizado esforços sistemáticos de pesquisa e de publicação em torno do tema. Isoladamente, cada equipe possui já significativa experiência acumulada nos estudos de participação política. Assim, a equipe proponente, ligada ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Universidade Federal de Santa Catarina, é composta por pesquisadores que, agrupados nos Núcleos de Pesquisa em Movimentos Sociais (NPMS) e no Núcleo de Estudos sobre Comportamento e Instituições Políticas (NECIP), têm concentrado seus esforços recentes no estudo dos determinantes da participação política na América Latina (voto, ativismo partidário e protestos), nos estudos sobre a dinâmica do associativismo civil e da relação entre participação e representação em instituições participativas, além dos estudos sobre instituições políticas brasileiras e comportamento eleitoral. Os membros da equipe têm coordenado e/ou participado de projetos de pesquisa em Editais das agências de fomentos nacionais, como o CNPq, além de dois deles serem bolsistas Produtividade em Pesquisa. Destaca-se ainda a participação ativa dos pesquisadores nas principais instituições científicas da área, como Sociedade Brasileira de Sociologia, Associação Nacional de Pesquisa e Pós Graduação em Ciências Sociais e Associação Brasileira de Ciência Política. A equipe da Universidade Estadual de Maringá, por sua vez, está ligada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais dessa instituição e atua no Núcleo de Pesquisas em Participação Política da mesma. Esses pesquisadores têm se dedicado a investigações sobre as novas institucionalidades participativas e sobre as alterações nas modalidades de engajamento cívico no contexto nacional e latino-americano. É importante destacar que os membros dessa equipe têm estabelecido parcerias duradouras com os participantes da instituição proponente, merecendo destaque a cooperação entre os professores Julian Borba (UFSC) e Ednaldo Ribeiro (UEM), que já renderam diversos projetos financiados pelo CNPq e pela Fundação Araucária e mais de uma dezena de artigos publicados em anais de congressos e periódicos especializados. A equipe da Universidade Estadual Paulista – UNESP tem seus membros ligados ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Ciências e Letras – campus Araraquara. Os pesquisadores Wagner de Melo Romão e Carla Giani Martelli são ligados ao Grupo de Pesquisa Participação, Democracia e Políticas Públicas, que tem realizado atividades de pesquisa acadêmica, sobretudo, quanto aos vínculos entre a ação governamental em políticas públicas e os espaços de participação institucional, além das modalidades não-institucionalizadas de participação. O Grupo organizou, em abril de 2013, o I Encontro Internacional Participação, Democracia e Políticas Públicas: aproximando agendas e agentes, que contou com mais de 400 inscritos de todo o país e do exterior e a apresentação de mais de 250 trabalhos em nível de pós-graduação. Já a pesquisadora Maria Aparecida Chaves Jardim é líder do Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Sociedade, Poder, Organização e Mercado e é especialista em temas relacionados ao mundo sindical e suas relações com o Estado. Também é importante destacar a participação ativa dos pesquisadores em instituições científicas como a ANPOCS, SBS, ABCP, Latin American Studies Association (LASA) e Associação Latino-americana de Ciência Política (ALACIP), com trabalhos publicados nos respectivos anais e suas inserções em redes internacionais de pesquisa sobre o tema em tela. Desse modo, compreendemos que a agenda de trabalho que constitui esta proposta tem a particularidade de reunir especialistas com o interesse comum na temática da participação política, e que estão inseridos em distintos programas de Pós-Graduação do país. Além de ampliar a interação científico-acadêmica, constituindo uma rede de pesquisa e de cooperação que deverá incorporar alunos de graduação, mestrado e doutorado, o projeto prevê a oportunização da realização de estágio pós-doutoral tendo em vista a formação de quadros altamente qualificados no campo das Ciências Sociais do Brasil.